GT Solar da Rede Favela Sustentável Envia Carta em Resposta à Consulta Pública em Defesa à Energia Solar
A carta apresentada abaixo foi enviada, em 30 de dezembro de 2019, por membros da sociedade civil fluminense ligados ao GT Solar da Rede Favela Sustentável dedicados à ampliação de energia solar em favelas e comunidades de baixa-renda do Rio de Janeiro, em resposta à Consulta Pública 25 de 2019 que diz respeito a taxação de energia solar no Brasil proposta pela ANEEL.
Contribuição enviada à Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), em resposta à Consulta Pública 025 de 2019, que diz respeito a uma revisão da Resolução Normativa nº 482 de 2012.
Assinam o presente documento as seguintes instituições:
- Comunidades Catalisadoras (ComCat)/Rede Favela Sustentável
- Revolusolar, Babilônia e Chapéu Mangueira
- Insolar, Santa Marta
- Engenheiros Sem Fronteiras-Núcleo Rio de Janeiro
- Observatório de Favelas
- Redes da Maré
- Biá Produções Artísticas
- Fundação Gol de Letra
- SER Alzira de Aleluia, Vidigal
- Solarize Treinamentos Profissionais Ltda.
- Comunidade Beira Pica-Pau, Cordovil
- Comissão de Moradores da Comunidade Indiana Tijuca
- ReciclAção, Morro dos Prazeres
- Movimento Papo Limpo, Gávea e Comunidade Vila Parque da Cidade
- Cine & Rock, Rio das Pedras
- Ecomuseu de Sepetiba
- Pastoral do Meio Ambiente
- EcoCasa Silvestre
- ADACI Brasil
- Quilombo do Camorim
- Terra Una
- Instituto Ambiente em Movimento
- Associação dos Moradores do Horto
- Museu do Horto
- Upgrade Engenharia
- Associação Engenhar Brasil
- Minhocário Arboreum
- Casa Museu Rancho Verde
- Pastoral de Favelas
- Cooperativa Vale Encantado
- Associação Harmonicanto Música e Cidadania, Cantagalo
- RONGO, Pavuna
- Associação Social Beneficente Humanitária, Vidigal
- Entidade Ambientalista Onda Verde, Nova Iguaçu
- Museu de Favela, Cantagalo
- Cooperativa Transvida, Complexo da Penha
- Movimento SOS Jardim Gramacho
- Associação de Mulheres de Atitude e Compromisso Social (Amac)
- Associação Grupo Cultural Lata Doida, Realengo
- Movimento Baía Viva
1. Objetivo
A ANEEL abriu a Consulta Pública 025/2019 propondo mudanças na regulamentação para a Geração Distribuída no Brasil. Seguem, abaixo, contribuições de diversas entidades que trabalham com população de baixa renda e com propósito de impacto social. Objetivo deste documento é informar a ANEEL sobre impactos da sua proposta que não foram contemplados na elaboração da mesma.
2. O Momento da Disseminação da Geração Distribuída
Como qualquer tecnologia, a energia solar iniciou sua disseminação no Brasil com preços elevados. Ela era acessível apenas aos pioneiros dispostos a investir com retorno financeiro muito prolongado. O cenário mudou completamente com a queda dos preços. O retorno de investimento caiu e os bancos passaram a oferecer créditos facilitados: quem instala energia solar hoje paga o financiamento com o valor economizado na conta de luz. Capital próprio ficou desnecessário para aqueles que conseguem obter aprovação nas linhas de financiamento. Com isso, tornou-se possível que grande parte da população brasileira consiga ter acesso à energia solar. A tecnologia começou a se disseminar país afora, de forma democrática. A figura mostra o forte crescimento das instalações muito pequenas, com potência até 3kW.
3. Benefícios da Geração Distribuída
Para as famílias, o benefício direto da geração distribuída é a redução da conta de energia, um incremento na renda familiar do proprietário do sistema. É uma verba adicional que, certamente, será gasta com consumo adicional em comércios e serviços na vizinhança, medidas de saúde ou melhoria da habitação. As empresas que reduzem seus custos através da energia solar podem reduzir os preços cobrados dos consumidores. Desta forma, o benefício financeiro proporcionado pelas instalações de energia solar é redistribuído: o que antes era receita para as companhias de distribuição de energia passa a circular pela economia no país, gerando prosperidade para os negócios e novos postos de trabalho em diversos segmentos. A própria instalação dos sistemas solares gera empregos que chegaram ao número de 100.000 no país. Uma contribuição importante contra o desemprego que persiste em se manter em taxas elevadas.
4. O Impacto da Proposta da ANEEL sobre Famílias
Na Geração Distribuída, a energia não utilizada no mesmo instante é injetada na rede da concessionária. É esta energia que deve, pela proposta da ANEEL, pagar encargos setoriais que chegam a 63% da energia injetada. Em outras palavras, apenas 37% da energia injetada seria devolvida ao proprietário.
Essa proposta sobretaxa famílias que, em boa parte, estão ausentes dos lares quando o sol gera energia e, consequentemente, injetam grande parte da energia gerada. A ANEEL deixou de justificar porque as famílias, futuramente, deveriam arcar mais com o setor energético do que consumidores com consumo no horário da geração. Uma simulação de um sistema para uma residência simples (potência de 3kWp, fator de simultaneidade 30%) mostra que a economia mensal pode cair 44% com as regras propostas. Os novos encargos representariam, ao longo do ano, R$ 1.338—um valor que vai fazer falta na renda familiar.
A mesma sobrecarga será aplicada em geração remota que é a forma como moradores de apartamentos podem se valer da energia limpa, já que, geralmente, não possuem espaço nos terraços e coberturas para este fim e se tornará inviável a partir da efetivação da proposta. Sentimos falta da análise dos impactos da regulamentação sobre diferentes classes de consumidores, por isto consideramos o estudo incompleto e injusto.
5. Geração Distribuída em Comunidades
Uma série de projetos piloto está introduzindo a geração solar distribuída em comunidades de baixa renda. Esses projetos visam diversos objetivos:
- Redução dos custos de instituições comunitárias para garantir sua sobrevivência;
- Capacitação de moradores para ingressar no novo mercado de trabalho;
- Redução dos custos com energia para empresas e moradores locais;
- Regularização da conexão à rede da distribuidora; e
- Redução das perdas técnicas e não técnicas nas comunidades.
Essa aplicação da geração distribuída, apesar de incipiente, já apresenta bons resultados nas comunidades, motivo pelo que vem se expandindo, mas que será impactada de forma drástica caso a ANEEL torne a cobrança dos encargos propostos realidade.
6. Projetos com Geração Distribuída em Comunidades
A seguir, diversas entidades descrevem de forma sucinta projetos com geração distribuída em comunidades e o impacto das regras propostas.
6.1. Rede Favela Sustentável
Entidade: Comunidades Catalisadoras (ComCat)
Área de atuação: Grande Rio de Janeiro
A Rede Favela Sustentável (RFS) é uma rede com mais de 800 participantes e centenas de projetos, em sua maioria mobilizadores de práticas sustentáveis que vivem em favelas fluminenses, além de técnicos aliados que buscam apoiar essas iniciativas.
A RFS está organizada em sete grupos de trabalho que surgiram através da demanda das comunidades, um deles sendo o GT de Energia Solar, com 39 membros. Em 2019 esse GT foi o mais ativo da rede, seus membros protagonistas nos processos de espalhar e realizar energia solar pelas comunidades do Rio.
Foi realizado no final de 2019 um levantamento dentro de toda a rede com respeito às demandas dos projetos comunitários para ações futuras. Das iniciativas comunitárias com sede própria que fazem parte da Rede Favela Sustentável, 85% selecionaram que gostariam de receber painéis solares e se tornarem embaixadores pela energia solar dentro das suas comunidades, o maior índice entre as opções dadas de diversas tecnologias sustentáveis.
Entre elas estão projetos nos mais variados cantos da cidade, como na Vila Parque da Cidade, Cidade de Deus, Pavuna, São João de Meriti, Salgueiro, Camorim, Sepetiba, Cantagalo, Vidigal, etc. O que está sendo percebido ao construir a Rede Favela Sustentável é a incrível demanda das comunidades do Rio por soluções sustentáveis, localizadas e econômicas para seus variados desafios. Imagine uma rede de projetos comunitários, desde museus a hortas e pré-escolas, todos com placas solares e atuando como embaixadores desse empreendimento pela cidade? É esse o objetivo do GT Solar da RFS.
6.2. Revolusolar—Desenvolvimento sustentável de favelas através da energia solar
Entidade: Revolusolar
Áreas de atuação: Rio de Janeiro, Morro do Leme (favelas da Babilônia e Chapéu Mangueira)
Desde 2016, a Revolusolar atua nesses territórios, realizando instalações de energia solar, cursos de capacitação profissional e atividades educativas. Um exemplo é a instalação na Escolinha Tia Percilia, uma instituição tradicional da comunidade de reforço escolar para crianças, complementar à escola pública.
A Escolinha depende de trabalho voluntário local e passava por dificuldades financeiras, principalmente com as contas de luz. O sistema solar e a consequente redução na conta de luz permitiram a manutenção das atividades educacionais com qualidade para as crianças locais. Além de salientar os benefícios econômicos perdidos pelos futuros beneficiários das instalações nas favelas em consequência da revisão regulatória pretendida, ressaltamos também os potenciais impactos de redução de perdas não-técnicas (problema latente nas favelas do Rio de Janeiro).
Por fim, solicitamos uma atuação firme da ANEEL frente à distribuidora local (Light) que não está atendendo essa região de forma adequada, em dissonância às diretrizes da Agência. Funcionários da distribuidora justificam os atrasos de conexão e visitas técnicas com o argumento de que as comunidades são áreas de risco, mesmo que duas Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) garantam a segurança desde 2009, e funcionários da empresa são vistos diariamente na comunidade retirando conexões clandestinas.
6.3. Insolar—Por comunidades mais solares
Entidades: Insolar Assessoria Empresarial e Social Ltda. e Associação Instituto Insolar, em conjunto intituladas apenas “Insolar”.
Resumo: A Insolar é um negócio social que aposta na combinação de tecnologia, energia, conhecimento e oportunidade como principais ferramentas para que comunidades em situação de potencialidade possam desenvolver seus talentos empreendedores e, dessa forma, fortalecer economias locais e nacionais.
Prioridade: A principal frente de atuação da Insolar é a Insolar Comunidades que tem como missão promover a adoção da tecnologia fotovoltaica em comunidades urbanas através de modelos de negócio sustentáveis, de forma a potencializar seus benefícios econômicos, sociais e ambientais.
Estratégia: A Insolar dialoga com diferentes atores do setor energético valorizando comunalidades e assegurando o melhor resultado possível para todas as partes envolvidas.
Sejam elas consumidoras, geradoras ou distribuidoras de energia, o diálogo e a construção de soluções intersetoriais tem sido a tônica da Insolar desde o seu projeto piloto até sua estratégia de democratização.
Benefícios: Sob a ótica do setor elétrico, alguns impactos positivos do trabalho da Insolar Comunidades são:
- Capacitação e geração de renda: capacitações compatíveis com as necessidades e exigências do mercado de trabalho no setor elétrico contribuem com o aumento da renda familiar permitindo que beneficiários honrem seus compromissos financeiros—incluindo a conta de energia, um dos principais itens do orçamento familiar em comunidades urbanas (terceira maior despesa na favela Santa Marta, no Rio de Janeiro, no recorte de agosto de 2016);
- Acessibilidade tecnológica: a adesão à microgeração de energia solar com um custo mensal inferior à economia de energia gerada pelo sistema fotovoltaico permite que seus beneficiários, em especial empreendedores(as), possam adquirir a tecnologia e reduzir sua conta de energia reduzindo a inadimplência dos moradores destas comunidades em relação às distribuidoras de energia;
- Inovação participativa: o engajamento dos segmentos da sociedade mais diretamente impactados pelos grandes desafios do setor elétrico nacional contribui para que a busca por soluções seja mais dinâmica, inovadora e assertiva.
Desafios: A tecnologia fotovoltaica no Brasil ainda apresenta grandes desafios em relação às comunidades urbanas:
- Precariedade das instalações elétricas,
- Baixos índices de inclusão financeira,
- Dificuldade de acesso a crédito adequado,
- Informalidade das atividades econômicas,
- Organicidade do crescimento habitacional,
- Cultura de curto prazo que prioriza as necessidades emergenciais, e
- Vulnerabilidade territorial às oscilações políticas, econômicas, sociais e ambientais
Oportunidades: Esses desafios não inviabilizam a adoção da tecnologia fotovoltaica como uma das principais ferramentas para que o setor elétrico possa equacionar seus maiores desafios. Muito pelo contrário, eles fortalecem ainda mais a importância de se preservar essa ferramenta, protegida de quaisquer ônus ou taxações e estimulada através de novos modelos de negócio, acesso a crédito, subsídios, isenções, e de todas as demais formas possíveis de estímulo que permitam que estas comunidades prosperem.
Em parceria com um grande banco público, o setor privado, demais organizações do setor e, acima de tudo, moradores e liderança locais, a Insolar já possui instalações fotovoltaicas previstas ou já realizadas em 15 comunidades do Rio de Janeiro, além de projetos em São Paulo e outras importantes cidades/capitais do país, sempre em colaboração com grandes empresas do setor energético.
Conclusão: Acolher a inovação, além de imprescindível para evitar a obsolescência tecnológica do setor elétrico, é fundamental para o desenvolvimento dos novos modelos de negócio que serão essenciais para a saúde desse setor. Assim como a microempreendedora de uma favela carioca depende de energia acessível para o sucesso do seu negócio, a distribuidora de energia depende da prosperidade econômica de muitas micro-empreendedoras. Ambas desejam que seus negócios prosperem. E a Insolar acredita que todos podemos prosperar juntos.
Recomendação: Apesar do entendimento de que o avanço da tecnologia solar deve ser promovido em todos os setores e segmentos da sociedade brasileira, entendemos que as comunidades de baixa renda merecem uma atenção especial tendo em vista que:
- os desafios energéticos desses territórios já são conhecidos pela ANEEL, porém ainda são pouco compreendidos dada a sua complexidade sistêmica e peculiaridades contextuais;
- os projetos fotovoltaicos nessas comunidades ainda estão em estágio experimental; e
- a tecnologia ainda pode se revelar como solução para grandes desafios do setor elétrico nacional.
Recomendamos então:
- a suspensão de todas as iniciativas que possam desestimular o avanço da tecnologia fotovoltaica em comunidades de baixa renda no país;
- a convergência de esforços e recursos do setor elétrico em prol da busca de soluções sustentáveis para os desafios energéticos das comunidades;
- a instauração de um grupo de trabalho intersetorial para discutir possíveis alternativas para os desafios energéticos nacionais, em especial em comunidades urbanas.
Reconhecimento: A Insolar parabeniza a ANEEL pelo protagonismo nas discussões regulatórias sobre o avanço da tecnologia solar; pela abertura, via audiências públicas, de espaço para que o tema seja discutido; e pelo fomento a projetos de Eficiência Energética e de Pesquisa e Desenvolvimento focados em comunidades urbanas em parceria com as grandes distribuidoras de energia. Acima de tudo, temos a convicção de que podemos contar com a liderança da ANEEL para proporcionar condições favoráveis para que o mercado de energia fotovoltaica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes e em benefício da sociedade, em especial das comunidades em situação de potencialidade.
6.4. Engenheiros Sem Fronteiras-Núcleo Rio de Janeiro
Área de atuação: Rio de Janeiro
Projeto Abrigo Sustentável
O Engenheiros Sem Fronteiras-Núcleo Rio de Janeiro (ESF-Rio) tem por objetivo instalar sistemas sustentáveis como a energia fotovoltaica e aproveitamento de águas pluviais em abrigos que se espalham por todo o Rio de Janeiro, de crianças, idosos, dependentes químicos, entre outros. Muitos desses abrigos sofrem para se manter, e um dos maiores inimigos são as contas estratosféricas de energia elétrica e água devido à quantidade elevada de pessoas que vivem nesses lugares.
Além do benefício social e econômico, há uma redução dos impactos ambientais gerados pelos sistemas instalados. Os benefícios econômicos gerados pelo projeto são revertidos diretamente em projetos que beneficiam os moradores desses abrigos. Assim, os Engenheiros Sem Fronteiras-Núcleo Rio de Janeiro propõem acelerar a utilização de sistemas sustentáveis, especialmente em ambientes desfavorecidos que precisam cortar custos.
São quatro abrigos sendo beneficiados com tais sistemas, impactando direta e indiretamente mais de 3.000 pessoas.
Projeto Educação Sustentável
Neste projeto o ESF-Rio visa oferecer a oportunidade para que jovens que estejam em risco social tenham um contato mais próximo com sistemas sustentáveis de engenharia. Foi construído um laboratório de Energia Solar Fotovoltaica que servirá para as aulas práticas em sistemas de energia elétrica sustentáveis. A energia elétrica hoje é um fator importante para o desenvolvimento humano local e ter conhecimento de maneiras mais sustentáveis para gerar essa energia é crucial para formação de cidadãos e cidadãs com maior consciência ambiental de suas atividades.
Elaborou-se um material para um programa educacional em sustentabilidade, focando em captação de água da chuva e instalação de sistema de energia solar fotovoltaica. O embasamento prático e teórico da sustentabilidade hoje já faz parte do currículo obrigatório da educação de jovens em vários países do mundo.
No Brasil, com o precário acesso à educação pública de qualidade, os jovens estão sujeitos a uma péssima grade curricular, principalmente nas comunidades e periferias. A educação de extensão tem sido uma alternativa clara para mudar a realidade desses jovens.
Metas:
- Contribuir para a transformação das condições sociais e/ou ambientais de comunidades e grupos;
- Fortalecer processos de produção sustentável e inclusiva, com geração de renda;
- Fortalecer processos de capacitação e formação.
Na primeira edição do projeto contabilizou-se mais de 300 pessoas impactadas direta e indiretamente.
6.5. Observatório de Favelas—Geração Compartilhada com o Espaço Bela Maré
Entidade: Observatório de Favelas
Área de atuação: Complexo da Maré
Desde 2017, o espaço de arte Bela Maré conta com um sistema solar de 16 kWp de potência. O espaço pertence ao Observatório de Favelas, cuja sede se encontra a duas quadras do Bela Maré. O excedente da energia gerada é compartilhado com o Observatório.
Pelas regras propostas devem ser cobrados encargos sobre a energia compartilhada. Essa cobrança pode chegar a mais de R$ 7.000 por ano, um valor que certamente fará falta nos projetos de educação profissional que o Observatório executa. Solicitamos que a ANEEL se abstenha dos encargos sobre a energia compartilhada.
6.6. Redes da Maré—Casa das Mulheres
Entidade: Redes da Maré
A Redes da Maré é uma instituição da sociedade civil que tem como território as 16 favelas da Maré.
A Redes da Maré mantém na Casa das Mulheres uma capacitação culinária para mulheres. A instalação de um sistema fotovoltaico no local está em planejamento, com objetivo de poder aumentar a quantidade de vagas em consequência
da redução dos custos.
A taxação proposta pela ANEEL reduziria esse efeito benéfico para a população local.
A Casa das Mulheres da Maré é um espaço concebido pela Redes da Maré para fomentar o protagonismo das mulheres da região, contribuindo para a melhoria da condição de vidas dessas mulheres e, consequente, de todos os que as cercam. Trata-se da concretização e do reconhecimento do papel das mulheres no surgimento de movimentos sociais e de lutas ligadas à infraestrutura na Maré desde a década de 80.
O conjunto de favelas da Maré, como vários territórios de mesmo perfil, carece de políticas de campanhas públicas sobre autossustentabilidade e de um maior entendimento sobre as várias formas de energia.
A busca pelo desenvolvimento sustentável com alternativas que estimulem o crescimento econômico, mas que tenham baixo ou nenhum impacto ambiental, está diretamente ligada à energia solar fotovoltaica e é nesse sentido que entendemos a energia solar como um forte e potente impulsionador no desenvolvimento territorial da Maré.
A energia solar nos traz também forte apelo de melhor interação entre o homem, a natureza e novas perspectivas ambientais. Contamos na Maré com uma excelente incidência solar, facilitando a participação local na construção de um novo diálogo energético que tenha fortes impactos socioambientais, econômicos e de desenvolvimento sustentável.
6.7. ELA (Escola Libertária de Artes)
Entidade: Biá Produções Artísticas
Área de atuação: Complexo da Maré (com possível expansão para outras comunidades)
A ELA é uma escola de artes itinerante montada em uma Kombi e desde outubro de 2019 está em fase experimental funcionando no Parque Ecológico da Maré.
A ELA possui um pequeno sistema fotovoltaico que produz, de forma independente e gratuita, energia para os afazeres artísticos e pedagógicos da Escola (projeção, luz, ventilador, geladeira, som, etc.). O painel solar também gera debates sobre sustentabilidade e empoderamento do povo periférico a respeito das tecnologias fotovoltaicas.
Em dois meses de existência a ELA já atendeu cerca de 300 pessoas, funcionando uma vez por semana, e pretende ampliar o seu funcionamento no ano de 2020.
6.8. Fundação Gol de Letra—Educação para Crianças e Jovens
Entidade: Fundação Gol de Letra
Área de atuação: 11 locais em diferentes estados do Brasil e Guiné Bissau
A Fundação Gol de Letra é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que nasceu do sonho dos tetracampeões mundial de futebol Raí e Leonardo de contribuir com a educação de crianças e jovens de comunidades socialmente vulneráveis, para que tenham mais oportunidades e perspectivas de vida.
A Fundação também investe esforços na sistematização de suas práticas e metodologias e, por meio da área de Disseminação, busca expandir o alcance de seu trabalho ao compartilhar sua tecnologia social com profissionais e organizações de outras localidades.
Responsável pelo desenvolvimento de ações com foco nas famílias e comunidades do bairro do Caju, um dos bairros com menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Município do Rio de Janeiro, a Fundação atua de maneira transversal e interligada a todos os outros projetos desenvolvidos pela Fundação Gol de Letra na região. O foco é a interlocução interinstitucional e com os moradores, bem como o fortalecimento das redes socioassistenciais locais.
A Fundação mantém uma escola no bairro que conta com um sistema fotovoltaico que contribui substancialmente com os custos da entidade. Hoje, toda a energia gerada pelo sistema solar é aproveitada para reduzir a conta de energia. Pela proposta da ANEEL, somente 37% da energia gerada em horas sem atividades escolares seriam contabilizadas—uma redução que nos forçará a reduzir atividades benéficas para a sociedade.
Esse programa se encaixa nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 3, 4, 5, 10, 16.
Desenvolvimento Pessoal e Profissional
A Fundação Gol de Letra entende que o papel de uma organização que atua em comunidades de vulnerabilidade socioeconômica é oferecer ao público adolescente e jovem possibilidades e oportunidades por meio de conhecimentos, práticas, vivências e diálogo. Ou seja, promover atividades que atendam suas necessidades formativas, educativas e sociais, ampliando seu repertório educacional e cultural, sua autonomia e preparando-os para o exercício da cidadania.
Desse modo, no âmbito da juventude, o foco do trabalho da Gol de Letra se divide em três grandes eixos: Empregabilidade, Formação de Monitores e Arte e Comunicação. São essas as temáticas de atuação dos programas e projetos voltados ao público jovem, que são desenvolvidos por meio de cursos profissionalizantes e de qualificação; formação de agentes multiplicadores; oficinas de empregabilidade e projeto de vida; e oficinas de linguagens artísticas.
Buscamos assim, abranger diferentes interesses e demandas dos jovens em relação à sua formação, inserção profissional, geração de renda, organização pessoal e familiar e, acima de tudo, proporcionar condições favoráveis ao seu pleno desenvolvimento.
“Fizemos uma contribuição com as placas solares aqui no Rio de Janeiro, para a Fundação Gol de Letra. Para nós, como funcionários, é um prazer representar a empresa e saber que ela sempre se preocupa com a questão social e ambiental.”—Alfredo Poblador, diretor industrial da planta da Usina Termoelétrica da EDF Norte Fluminense.
6.9. SER Alzira de Aleluia — Vidigal
Entidade: SER Alzira de Aleluia
Área de Atuação: Favela do Vidigal
SER Alzira de Aleluia é uma organização comunitária sem fins lucrativos cuja missão é trabalhar ao lado da comunidade do Vidigal promovendo a cidadania e fornecendo práticas educacionais, esportivas e formação cultural no Vidigal, assim como a promoção de espaços de reflexão, independência e autonomia. O seu lema é SER: Servir, Educar e Renovar.
A SER Alzira realizou um levantamento do potencial de implementação de painéis solares em sua sede e tem como intenção a realização da mesma, com o objetivo de gerar energia em pequena escala como forma de desenvolvimento de tecnologia social. Também é a favor de estímulos a partir de políticas públicas de energia sustentável para reduzir ligações clandestinas de energia na comunidade e da promoção de educação ambiental para integrar a comunidade com a tecnologia de energia solar.
6.10. Solarize Treinamentos—Consultoria e Capacitação
Entidade: Solarize Treinamentos Profissionais Ltda.
Área de atuação: Brasil, com foco no Rio de Janeiro
A Solarize tem apoiado diversas iniciativas sociais desde 2012 em atuação continuada. Alguns exemplos:
- Capacitação de profissionais em instalação de energia solar, com concessão ocasional de bolsas;
- Consultoria para elaboração projetos de energia solar em abrigos de jovens, centros culturais e iniciativas em comunidades;
- Cessão de material didático para cursos de capacitação;
- Intermediação com indústria e comércio com objetivo de obter doações para um centro de capacitação para moradores de comunidades.
Percebemos o enorme potencial da energia solar para a população de baixa renda, como também os fortes impactos da proposta da ANEEL para esses projetos, nos termos descritos neste documento.
7. Conclusão e Recomendação
Os projetos relacionados acima mostram o enorme potencial da energia solar em geração distribuída para a população menos favorecida. Ela gera um benefício múltiplo em áreas carentes. A justificativa para cobrar encargos sobre a energia injetada parte de um suposto prejuízo que a geração distribuída causa à sociedade. Não conseguimos enxergar tal prejuízo e não o vimos justificado de forma convincente.
O efeito dos encargos propostos será uma redução impactante dos benefícios e um atraso na disseminação da energia solar dentre a população menos favorecida. Por isso solicitamos à ANEEL postergar a cobrança dos encargos, estudar os benefícios sobre a sociedade de uma forma mais ampla e elaborar um conceito que respeite um equilíbrio entre os atores no setor elétrico—que somos todos nós.