Telecentro: Casa do Gestor Catalisador (2003-2008)

Visão Geral

No início de 2000, a falta de um espaço físico para encontros e a falta de acesso à Internet limitavam drasticamente o potencial impacto das lideranças locais e sua capacidade de compartilhar soluções comunitárias com outras favelas e comunidades de baixa renda do Rio de Janeiro. Vimos que muitos líderes de comunidades, mesmo aqueles que são bem conhecidos dentro de suas próprias comunidades, e em sua própria rede, tendiam a trabalhar de forma isolada em relação a projetos comunitários em outras partes da cidade.

Como resultado, no início de 2003 a ComCat inaugurou um telecentro: a Casa do Gestor Catalisador, na área central e histórica do porto do Rio de Janeiro.

Nos anos seguintes, sem publicidade formal, a Casa atraiu mais de 1.050 líderes locais de 215 bairros de todas as partes do Rio de Janeiro. Um adicional de 400 profissionais e estudantes (incluindo jornalistas, ativistas, professores e estudantes universitários) também dividiram o espaço, sem mencionar os gestores comunitários de outros 7 municípios do Rio, 23 dos 26 estados brasileiros e 22 países. Confira esta apresentação ilustrativa de como esta rede funcionava.

No quinto aniversário da Casa, em fevereiro de 2008, o acesso à Internet estava difundido nas comunidades do Rio de Janeiro, e os líderes estavam cada vez mais familiarizados com as comunidades online. Além disso, havia novas oportunidades de trocas face a face, criadas por outras organizações, e um contexto urbano em transformação. Como resultado, sentimos com segurança que era o momento de fechar a Casa e comemorar seu sucesso.

Este projeto pode ser útil em qualquer região urbana, reconhecendo-se que ter um lugar central, ao invés de vários postos, é o que permite as trocas e a polinização cruzada entre diversos grupos e bairros. Em 2006, a UN Habitat reconheceu a Casa do Gestor Catalisador da ComCat como uma das 70 “Idéias Replicáveis” para sustentabilidade urbana.

Faça uma viagem pela história e confira o arquivo de fotos dos 5 anos da Casa. Ou veja uma sequência de apresentações de slides da Casa que Rosa Zambrano, membro da equipe, reuniu anos depois para registro da Casa em 2003, 2006, 2007-2008, e um resumo geral.

Nossos objetivos com a Casa

  • Criar um espaço de encontro das lideranças das comunidades, onde eles poderiam trocar experiências, formando uma rede amigável de solidariedade;
  •  Oferecer recursos de Internet para a documentação, divulgação e desenvolvimento de projetos comunitários;
  • Ampliar a troca de conhecimento e informações sobre as iniciativas de outras organizações que apoiam iniciativas comunitárias;
  • Aumentar constantemente a rede de voluntários de apoio à Casa e oferecer oficinas de escrita, inglês, webdesign, e outras áreas que surgissem, especificamente para fortalecer os gestores das comunidades;
  • Mostrar arte comunitária (pinturas, artesanato, e muito mais) por meio de exposições temporárias nos corredores da Casa, onde admiradores pudessem visitar e comprar as obras de arte;
  • Promover eventos na Casa para que indivíduos e grupos locais que normalmente tinham pouco ou nenhum contato com comunidades de baixa renda, mas que desejassem aprender e apoiar as iniciativas das comunidades, pudessem aprender um pouco mais.

Espaços

1. Sala de Oficina Multimídia

Neste espaço, oficinas eram organizadas por líderes comunitários e voluntários que frequentavam a Casa, com o objetivo de fortalecer uns aos outros. A equipe da ComCat ajudava os membros das comunidades e voluntários que demonstrassem interesse em compartilhar seus conhecimentos a desenvolver e gerenciar as oficinas. As oficinas realizadas abrangeram uma ampla variedade de tópicos, incluindo: inglês, francês, espanhol, rádio comunitária, inclusão digital, Nós do Cinema (capacitação de jovens de favelas em cinematografia), Palavra Falada (hip hop), e reuniões entre grupos incluindo iniciativas de justiça para os jovens, a Babels, e a Caravana pela Paz.

2. Laboratório de Informática

Computer lab @ CasaAqui líderes comunitários se beneficiavam do acesso à Internet e suporte técnico. O laboratório de informática foi utilizado para enviar propostas de financiamento, manter contato com outros gestores, escrever cartas para orgãos públicos, preparar folhetos, criar logotipos, consultar notícias e sites educativos, visitar o site da ComCat para saber mais sobre outros projetos, e documentar projetos no Banco de Soluções Comunitárias. Fora isso, voluntários de universidades locais e líderes comunitários com experiência em informática ofereciam oficinas de TI algumas vezes por ano, para os gestores de projetos com dificuldade em utilizar computadores.

Desenvolvemos tecnologias únicas para este espaço; sobretudo, através de um sistema de logins, em que os líderes que frequentavam a Casa atualizavam suas informações de contato e nos diziam como eles estavam usando as instalações do espaço a cada visita. Nós também disponibilizamos uma pasta segura e personalizada onde todos os visitantes podiam salvar seus documentos.

3. Sala de Reunião Informal

Esta pequena sala era o lugar onde as reuniões informais aconteciam diariamente na Casa. Pessoas à espera de um computador ou em horário de almoço sentavam aqui e faziam reuniões. Pequenos grupos de líderes comunitários, que procuravam um lugar central em relação às suas comunidades diversificadas, marcavam reuniões para discutir temas importantes ou eventos que estavam sendo organizados. Além disso, a cada dois meses, durante o lançamento de uma nova exposição de arte, esta sala se enchia de pessoas – líderes comunitários, artistas, estudantes, professores universitários, jornalistas, e outros – que vinham para apreciar a arte, ouvir a música do bloco de Carnaval Escravos da Mauá (cujos ensaios aconteciam na praça em frente à Casa), e fazer novos amigos.

4. Galeria ComCat: Exposições de Arte Comunitária

Realidades locais, desafios, sucessos e esperanças são frequentemente expressos em arte e artesanato feito por artistas de comunidades de baixa renda. A Galeria ComCat era um espaço para a promoção de artistas e artesãos das comunidades envolvidos em movimentos sociais do Rio de Janeiro. As exposições duravam dois meses após a festa de lançamento oficial. A Galeria ocupava o hall de entrada e a sala de oficina multimídia da Casa.

Acari students visit the Casa with 'Deley de Acari'Características Replicáveis

No Rio de Janeiro, líderes comunitários de toda a região tinham um espaço central para se encontrarem, trocarem idéias e compartilharem experiências. As ligações feitas e as informações trocadas eram espontâneas. Nossa função era manter o espaço convidativo e estimulador de atividades comunitárias. Nós gostaríamos de compartilhar experiências e ajudar a inspirar espaços semelhantes em outros lugares.

Segue abaixo uma lista das características do espaço que recomendamos em caso de replicação:

  • A localização deve ser acessível por transporte público, em uma viagem, a partir de qualquer local dentro da região metropolitana;
  • Um espaço “caseiro”: achamos importante o fato de que era uma casa, pois era importante na construção de uma cultura fraterna de conforto, intercâmbio e diálogo;
  • Membros da Casa e visitantes frequentes apresentavam a Casa e seus objetivos a todos os visitantes e os recebiam com café e biscoitos; uma geladeira e armários estavam disponíveis para utilização temporária;
  • Não havia taxa para uso do espaço, devido à precária situação sócio-econômica dos gestores comunitários do Rio de Janeiro e, além disso, descobrimos que a troca de recursos monetários entre os funcionários e gestores comunitários enfraquecia os laços de confiança e camaradagem, e assim evitamos a maioria dessas trocas para garantir a natureza saudável do espaço;
  • Workshop in Casa workshop roomNo registro inicial eram coletados: nome, projeto comunitário e informações de contato, além de perguntarmos a todos os visitantes o que eles queriam aprender, e o que eles poderiam ensinar aos outros; a partir desta informação, as oficinas eram organizadas;
  • O espaço era disponibilizado especificamente para apoiar pessoas em seus eforços de expandir seus projetos relacionados à organização comunitária ou mobilização social; indivíduos querendo usar o espaço para objetivos pessoais, ao invés de objetivos coletivos, eram direcionados para lan houses ou outros locais próprios para tais atividades;
  • As conexões formadas e as informações trocadas na Casa eram imprevisíveis e dependiam dos gestores que visitavam o espaço; o papel da equipe era manter um espaço acolhedor que alimentava e estimulava trocas naturais e fortalecedoras;
  • Oficinas, debates e palestras oferecidas no espaço eram organizadas por voluntários, incluindo gestores comunitários, que procuravam a equipe da ComCat para fazer uso do espaço, assim como as salas de reuniões e o laboratório de informática; a equipe da ComCat não direcionava ativamente o uso e o conteúdo do espaço;
  • O espaço era neutro em relação às diferenças de gênero, raça, religião, idade ou orientação sexual;
  • Os gestores comunitários utilizavam os recursos da Casa independente do foco temático do seu trabalho;
  • Trocas entre gestores comunitários com interesses diversos eram ativamente incentivadas. Por exemplo, um projeto de saúde, AUAPARN, organizou uma oficina de computação com um grupo de mulheres, Mulher em Ação, e com um movimento de sem-teto, Chiquinha Gonzaga;
  • A divulgação aconteceu naturalmente, por boca a boca; seguindo atentamente esses preceitos, o espaço tornou-se uma referência entre os gestores comunitários no Rio e novos líderes nos visitavam quase diariamente graças à divulgação positiva feita pelos próprios líderes;
  • Women's group meetingNossa equipe oferecia para uma pessoa só o que poderia oferecer a todos; isto nos encorajou a desenvolver laços mais fortes com os gestores comunitários e os próprios voluntários, que efetivamente desenvolviam atividades no espaço, enquanto a ComCat tinha uma pequena equipe para simplesmente administrá-lo e mantê-lo;
  • Reuniões abertas foram realizadas regularmente com os usuários da Casa para determinar como o espaço e o website da ComCat poderiam melhor atendê-los, e para discutir questões importantes que afetavam projetos locais no momento;
  • Cada visita e a utilização dos computadores e dos espaços de reunião eram registradas em um banco de dados customizado, a fim de determinar como o espaço estava sendo usado, o que funcionava, e o que poderia melhorar.

O fator mais importante para o sucesso foi a filosofia que alimentou a abertura e o gerenciamento da Casa: confiança, respeito, diversidade, apoio, e compaixão eram os valores que a moviam.

Principais Obstáculos

Como acontece com todos os projetos, havia obstáculos. No interesse de apoiar o sucesso de projetos semelhantes em outros lugares, listamos aqueles que foram os mais importantes:

  • Encontrar e preparar uma equipe capaz de lidar com a carga emocional de trabalhar com pessoas que chegam diariamente com problemas, não só seus, mas de seus projetos e dos beneficiários de seus projetos.
  • Encontrar formas adequadas para lidar com as pessoas que vinham para usar o espaço com as motivações erradas: para benefício pessoal ou ganho privado, particularmente dado o nosso trabalho constante para tornar o espaço convidativo e acolhedor para todos.
  • Trabalhar com diversos círculos de pessoas no mesmo espaço, alguns dos quais não se davam bem devido a diferenças religiosas e filosóficas.

Avaliação

Ao longo de 5 anos na Casa utilizamos várias formas diferentes de avaliar o nosso trabalho:

  • Women's group taking a breakReuniões mensais abertas foram realizadas, gerando comentários preciosos de como tornar o espaço mais útil, bem como proporcionar oportunidades para os líderes conhecerem uns aos outros;
  • Um Conselho Comunitário foi formado para fazer contribuições em reuniões mensais privadas nos últimos 2 anos da Casa, enquanto nós avaliávamos a possibilidade de manter ou não o espaço;
  • O registro diário solicitava, dos usuários dos computadores, informações sobre: o status do trabalho comunitário que eles estavam realizando na Casa, e como o espaço estava apoiando esse processo;
  • Conversas regulares entre os líderes comunitários e a equipe em que se mencionavam sucessos gerados graças ao espaço eram registradas semanalmente em relatórios escritos;
  • Todas as atividades foram registradas em nosso arquivo de fotos e;
  • A equipe postava os resultados das atividades do espaço em um blog.