2° Encontro Anual da Rede Favela Sustentável Fortalece Laços e Traça o Futuro da Rede

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Rede Favela Sustentável (RFS) é um projeto da Comunidades Catalisadoras (ComCat)* desenhado para construir redes de solidariedade, dar visibilidade, e desenvolver ações conjuntas que apoiem a expansão de iniciativas comunitárias que fortalecem a sustentabilidade ambiental e a resiliência social em favelas de toda a região metropolitana do Rio de Janeiro. O projeto começou em 2012 com a produção do filme Favela como Modelo Sustentável, tendo continuidade em 2017 com o mapeamento de iniciativas de sustentabilidade. Em 2018, o projeto organizou intercâmbios locais, especificamente, entre oito iniciativas mais duradouras e estabelecidas, e em seguida foi realizado um intercâmbio de dia inteiro que finalmente lançou a rede em 10 de novembro de 2018.

Em 2019, o projeto realizou uma segunda rodada de intercâmbios—dessa vez abertos a todos os membros da RFS e ao público em geral—em projetos baseados na BabilôniaCamorimPavunaVila Kennedy e Manguinhos. As atividades de 2019 culminaram com o segundo encontro anual de toda a Rede Favela Sustentável. Além de apresentar as iniciativas que receberam os cinco intercâmbios do ano, o dia convidou—os recém-lançados sete grupos de trabalho da Rede (dedicados a Energia Solar, Resíduos Sólidos, Educação Ambiental, Água e Esgoto, Memória e Cultura, Geração de Renda e Hortas e Reflorestamento) para apresentarem seus membros e planos e aprofundar seus trabalhos, envolvendo novas pessoas.


Em uma manhã nublada nas colinas de Santa Teresa, 126 mobilizadores de favelas e aliados técnicos de todo o Rio de Janeiro se reuniram para o segundo Grande Encontro anual da Rede de Favela Sustentável (RFS). Entre os participantes, 55% vieram de 48 diferentes favelas, com os outros 45%, majoritariamente, aliados técnicos de toda a cidade e além. O maior contingente veio da Zona Norte (37), seguido de perto pela Zona Oeste (35) e depois pela Zona Sul (22). Após inúmeras trocas frutíferas da RFS realizadas ao longo de 2019, o encontro anual ofereceu uma rara oportunidade de reunir a rede de iniciativas em um só lugar. Realizado em 9 de novembro, nas áreas arborizadas da EcoCasa Silvestre, com o apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil, os eventos do dia deram aos membros da rede a chance de refletirem, se envolverem e se conectarem, aproveitando as experiências de grupos de inúmeras favelas da cidade.

Ao chegarem, os participantes foram recebidos com um café da manhã, com geleias, bolos e pães com sabores primorosos, preparados pela chef Regina Tchelly e sua equipe do Favela Orgânica do Morro da Babilônia, na Zona Sul. No andar de cima, inspirados no grupo de trabalho de gestão de resíduos sólidos da RFS, organizadores do evento montaram uma mesa troca-troca onde os participantes deixavam os bens que não precisavam mais e levavam o que lhes interessasse. No mesmo espaço, o grupo de trabalho de geração de renda tinha uma área para exposição de artesanatos e produtos sustentáveis produzidos por membros da rede. Enquanto isso, uma mesa com papel e canetas estava a disposição para os participantes compartilharem, anonimamente, suas esperanças e medos na condução de iniciativas de sustentabilidade em suas comunidades.

Alguns membros trocaram garrafas de água reutilizáveis, bijuterias e lembrancinhas. Outros venderam sabonete caseiro e obras de arte. Outros ainda postaram comentários nos quadros de atividades, explicando que quase desistiram por que “duvidaram de mim” ou tiveram “falta de apoio”, mas continuaram porque encontraram “força comunitária”,”apoio de onde não esperava”, e por causa da própria RFS. “Quando vemos a rede crescendo, sabemos que não estamos sós!” escreveu um membro.

No início do dia, o grupo prestou homenagem ao falecido Miguel Silva de Moura (6/6/1955–25/6/2019), ex-presidente da Associação Comunitária Luiz Carlos Prestes em Cascadura, na Zona Norte, que havia sido um participante chave no lançamento da Rede um ano antes. Agora representando a associação, Carlos Augusto e Gisele Profeta subiram ao palco para homenagear o líder comunitário e seus 30 anos de serviço comunitário. “A primeira atitude de um líder é deixar um legado para que quem venha depois possa dar continuidade, como o Seu Miguel fez”, disse Carlos Augusto, acrescentando que espera continuar o legado de Miguel, servindo como líder para a juventude de hoje.

Destacando os intercâmbios da RFS de 2019, a diretora institucional da ComCat, Roseli Franco, apresentou o lançamento do vídeo, abaixo, produzido pela cineasta Luiza de Andrade. De abril a outubro, a RFS foi recebida por membros da rede em cinco intercâmbios de dia inteiro, nas seguintes iniciativas: RevoluSolar e Favela Orgânica na Babilônia, Zona Sul; na Associação Cultural Quilombo do Camorim em Jacarepaguá, Zona Oeste; na Região de Oficina Nacional de Grafite Organizado (RONGO) na Pavuna, Zona Norte; no Centro Comunitário Irmãos Kennedy (CCIK) e Agentes Ambientais na Vila Kennedy, Zona Oeste; e no Ateliê do Hadasha e projeto Teto Verde Favela, nas favelas de Manguinhos e Parque Arará, na Zona Norte.

Lideranças de cada uma dessas organizações anfitriãs tiveram a chance de falar após a exibição do vídeo, apresentando suas visões sobre o significado da Rede. Tocado pela Rede Favela Sustentável, André do Nascimento, da RONGO, disse que “a essência da favela nos faz sonhar e realizar mais” e lembrou ao público que precisamos “usar as oportunidades para mostrar o que sabemos fazer”. Para Adilson Almeida, da Associação Cultural Quilombo do Camorim, a RFS é sobre “lidar com as diferenças, ter respeito, e agir com cuidado”. Verônica Gomes Martins da Silva, presidente do CCIK, falou sobre a necessidade de valorizar as soluções das favelas e os aspectos positivos da comunidade, que muitas vezes são ignorados pela mídia. Luis Cassiano, do Teto Verde Favela, convidou todos para “verdejar por cima, nos telhados, para trazer vida, alimentação, beleza e esperança”. Por fim, Regina Tchelly falou sobre autocuidado e cuidados com a comunidade. Ela convidou todos a colocar as mãos sobre o próprio coração e depois sobre o de outra pessoa, lembrando a todos de “pensar no colaborativo, segurar as mãos e os saberes uns dos outros”.

Embora o vídeo tenha se concentrado nas poucas iniciativas que receberam os intercâmbios da RFS em 2019, a própria rede é composta por mais de 150 projetos por toda a região. A fim de trazer visibilidade e aumentar a conscientização, a RFS trabalhou para traçar essas iniciativas sustentáveis, mapeando sua presença na cidade. O Guillermo Douglass-Jaimes, conselheiro da ComCat e professor na Pomona College, Califórnia, assumiu recentemente a liderança no projeto de mapeamento. Na sua fala no sábado, Guillermo apresentou o protótipo para a atualização do mapa, apresentando uma versão acessível para smartphone na plataforma on-line ArcGIS proporcionada em parceria com a Pomona College. Com lançamento previsto para junho de 2020, o novo mapa da RFS permitirá que usuários pesquisem membros da rede por filtro de busca e acrescentem históricos institucionais aos seus perfis no mapa. A edição original do mapa está disponível abaixo:

A Coordenadora de Comunicação e Desenvolvimento da ComCat, Clara Ferraz, elaborou como a RFS se relaciona com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, especialmente os ODSs 11 (Cidades e Comunidades Sustentáveis) e 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes), enfatizando que sem antes alcançar a justiça social (ODS 16), o desenvolvimento sustentável (ODS 11) é impossível de ser alcançado. “Ao trabalharmos para ‘Cidades e Comunidades Sustentáveis’, devemos simultaneamente atender à necessidade subjacente de justiça social”, disse Clara. Embora os ODS sejam objetivos louváveis, ela acrescentou que eles também fazem generalizações amplas e nem sempre respondem às realidades de base. “Com as diversas comunidades do Rio de Janeiro em mente, a ComCat propõe ODSs localizadores, incluindo ‘Autonomia e Controle por parte da Comunidade’, ‘Canais de Comunicação Direta com o Governo’, e ‘Representação Justa e Não-generalizante na Mídia'”. Lançada recentemente, uma página especial criada para ilustrar como as atividades da ComCat, incluindo a RFS, se relacionam com os ODSs, está disponível aqui.

O dia então foi iniciado com uma série de atividades baseadas nos sete grupos de trabalho da RFS e em suas propostas para 2020. Os grupos se dedicam a: Água e Esgoto, Educação Ambiental, Energia Solar, Geração de Renda, Hortas e Reflorestamento, Memória e Cultura, e Resíduos Sólidos. Além de manter um ritmo denso de contato diário e compartilhamento de informações via WhatsApp, ao longo de 2019, os membros dos grupos se reuniram três vezes para debater projetos coletivos, fortalecendo a própria rede e as comunidades dos membros. Este foi o momento para compartilhar seus trabalhos com toda a RFS.

Antes de iniciarem as dinâmicas e discussões de aprofundamento, representantes dos grupos de trabalho apresentaram o foco do trabalho de seus grupos e as iniciativas que compõem cada grupo. Para o GT de Energia Solar, Tereza Onã, da Redes da Maré subiu ao palco; para o GT Água e Esgoto, Consuelo dos Santos, da RONGO, e Leo Adler, do Instituto Ambiente em Movimento; para o GT de Memória e Cultura, Thainã de Medeiros, do Museu das Remoções; para o GT de Geração de Renda, Guilherme Hadasha, do Ateliê do Hadasha; para o GT de Educação Ambiental, Iara Oliveira, do Alfazendo; para o GT de Hortas e Reflorestamento, Gabi Fleury do Planta na Rua; e para o GT Resíduos Sólidos, Ilaci Oliveira, da Cooperativa Transvida.


Ao iniciarem as dinâmicas e discussões de aprofundamento, cada grupo de trabalho envolveu outros membros da RFS com o seu tema. Alguns se concentraram especificamente nos desafios mais comuns enfrentados pelo grupo: no grupo de Energia Solar, Tereza Onã enfatizou que nas favelas do Complexo da Maré, ela via falta de democratização no acesso e de interesse na energia solar. A questão, disse Tereza era “como assegurar que o conceito de energia solar dialogue com esses territórios”. Outro membro do grupo, Alex França, do Engenheiros Sem Fronteiras, apontou que o único grupo que fala sobre o valor social da energia solar—e seus benefícios para moradores de favelas—em um recente protesto em Brasília contra o aumento dos impostos sobre a energia solar, foi o coorte de representantes da RFS presentes no protesto.

Simultaneamente, o GT de Água e Esgotoque já havia solicitado aos membros da RFS que compartilhassem imagens de esgoto não tratado e de fontes de água em suas comunidadesdedicou-se a ouvir cada participante sobre seus pontos de vista e experiências com essas questões. Engenheiros com experiência em tecnologias de esgoto ecológico localizadas esperam mapear membros de comunidades da RFS interessadas em testar essas tecnologias em 2020.

Enquanto isso, o GT de Geração de Renda falou da necessidade de gerar recursos financeiros, além de reconhecer o valor do conhecimento e dos recursos não-financeiros. O grupo planeja lançar um catálogo online, em 2020, de produtos e serviços oferecidos pelos membros da RFS.

O GT de Memória e Cultura mergulhou-se em uma profunda discussão sobre o papel dos museus comunitários na preservação da memória. A memória, por sua vez, é essencial para aprofundar o sentimento de pertencimento que leva moradores a cuidarem de suas comunidades. No entanto, os museus comunitários não são apenas ameaçados por questões de sustentabilidade financeira, mas museus populares como o Museu da Maré e o Museu Casa do Pontal também enfrentaram ameaças de remoção. A remoção, disse Thainã de Medeiros, torna-se uma maneira de apagar a identidade da comunidade. “Quando você cria um museu, você tenta consolidar uma história”, disse Thainã. “Retirar esses museus significa negar tudo isso”.

O GT de Hortas e Reflorestamento discutiu o potencial para a realização de projetos em conjunto com os grupos de Educação Ambiental e Energia Solar. Compartilhando suas experiências com o incentivo ao plantio e reflorestamento em suas próprias comunidades, os membros enfatizaram a necessidade de envolver os moradores e educar as crianças sobre a necessidade de espaços verdes. Como presente de despedida do grupo de trabalho, muitos levaram mudas para casa.

Outros grupos desenvolveram jogos interativos. No GT de Resíduos Sólidos, Gustavo Cunha, do Mundo Livres, e Marcella Vieira, do ReciclAção, fizeram com que os participantes tirassem o nome da organização um do outro de uma caixinha, trocando histórias de trabalho e ganhando artesanato feito com materiais reutilizados numa brincadeira de “Resíduo Oculto”.

Enquanto isso, o GT de Educação Ambiental começou com um jogo proposto por voluntários da EcoRede, sediada na Cidade de Deus, desafiando os participantes a manter um bambolê no ar, cada um usando um único dedo. Com o objetivo de provocar reflexões sobre a ação coletiva, os participantes começaram a “pensar na gente como uma rede”. Os membros da RFS devem “deixar o eu e focar no nós”, disse Lidiane, voluntária da EcoRede. “Só assim vamos conseguir formar laços e compartilhar experiências!”

Para concluir os eventos do dia, a Diretora Executiva das Comunidades Catalisadoras, Theresa Williamson, apresentou resultados preliminares da Pesquisa de Atualização da Rede Favela Sustentável de 2019. Theresa lembrou a todos que o formulário ainda está aberto e explicou que os dados coletados serão usados no desenvolvimento do novo mapa da RFS, bem como no planejamento das atividades do próximo ano. Por fim, os participantes decidiram que cada grupo de trabalho se reunirá uma última vez em 2019 para definir as metas do grupo para 2020 e discutir como organizar reuniões futuras. Antes do encerramento, o grupo agradeceu e desejou um feliz aniversário a Alessandro Macedo, anfitrião do evento na Ecocasa Silvestre.

Para Mina Tingui, voluntária do Teto Verde Favela, o dia poderia ser resumido em uma palavra: “integração”. O segundo Grande Encontro da RFS foi um grande sucesso, fortalecendo a rede e oferecendo várias oportunidades para participantes de diversas comunidades e iniciativas do Rio se encontrarem, compartilharem conhecimento e apoiarem-se mutuamente.

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